O que Você Precisa Saber sobre Tributação na Venda de Imóvel Rural

O que Você Precisa Saber sobre Tributação na Venda de Imóvel Rural

Quando você vende um imóvel, sabe que, geralmente, há a incidência de imposto sobre a diferença entre o que você pagou por ele e o valor pelo qual vendeu, certo? Essa diferença é conhecida como “ganho de capital. Daí, paga-se imposto de renda sobre  esse acréscimo patrimonial, ou seja, sobre a diferença positiva entre o custo de aquisição e o valor da transação.

Mas e se esse imóvel for rural?

Há peculiaridades que interessam ao fazendeiro, mas que também aparecem em certas operações de Fusões e Aquisições, nas quais, de algum modo, esse tipo de ativo esteja presente.

No Brasil, a legislação busca conferir certos incentivos à atividade rural. Um deles está relacionado justamente ao ganho de capital na alienação das propriedades. Aí, aplica-se um sistema peculiar – nele, o que importa é a natureza do imóvel, que deve ser rural. Esse conceito de “imóvel rural”, por sua vez,  é definido mais predominantemente pela atividade econômica nele desenvolvida e menos por sua localização em si. Mesmo em imóvel localizado em área urbana aplica-se regime de tributação diferenciado se nele forem desenvolvidas atividades típicas da área rural, como exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial (o tema foi, inclusive, afetado no STJ como Recurso Repetitivo sob o nº 174[1]).

No regime diferenciado de tributação da atividade rural, considera-se resultado tributável a diferença entre os valores das receitas recebidas e das despesas pagas no ano-base. Portanto, os investimentos realizados na atividade (benfeitorias, culturas, pastagens incluídas) integram as despesas para fins de apuração do imposto de renda. Em contrapartida, a legislação prevê que o valor da alienação da terra nua deve ser tributado em separado, como ganho de capital, independente de se tratar de pessoa física ou jurídica e qualquer seja o tipo de tributação (se por lucro real ou presumido).  Assim, pela Lei 9.393/96, o ganho de capital não considera a diferença entre o valor de venda e o de aquisição do imóvel rural, mas a diferença entre os Valores da Terra Nua (VTN) declarados pelo contribuinte para fins do imposto sobre propriedade territorial rural (ITR) em suas respectivas declarações (a DITR/DIAT) do (i) ano de aquisição e (ii) do ano de alienação.

Como, pela lei, a DITR deve contemplar um VTN equivalente ao preço de mercado em 01 de janeiro do ano a que se referir, surge uma primeira situação de inexistência de ganho de capital: se a venda for realizada no mesmo exercício, o VTN não varia e, portanto, não haveria ganho de capital.

Outra situação em que não haveria imposto a ser pago é se o VTN da época da aquisição e da época da venda forem iguais, ou este for menor que aquele.

Mas, e se o contribuinte não declarou ITR quando comprou o imóvel, ou quando o vendeu, ou em ambos os anos? E se ele compra e vende antes de entregar a DITR?

Pela Lei 9.393/96, a sistemática não se alteraria: o que importa é o VTN do ano de aquisição comparado com o ano de alienação. E isso não depende da entrega da DITR ou da falta dela, já que a própria lei prevê que, nessa hipótese, será considerado o VTN apurado com base no sistema de preço de terras (SIPT) da própria Receita.

Porém, uma controvertida Instrução Normativa – a IN 84/2001 –, a pretexto de regular a questão, inovou e ilegalmente previu situações que não estão na lei. Uma delas é que, nessa hipótese (ausência de DIAT), o ganho de capital deve ser calculado com base nos valores efetivos de aquisição e de alienação (valor do negócio, da escritura). O racional seria o de que o contribuinte não atendeu ao prazo de entrega da DITR ou deixou de apresentá-la.

Como se não bastasse, a Receita aplica essa mesma norma (IN 84/2001) para pessoas jurídicas (Solução de Consulta COSIT 118/2019), mas a norma se refere a pessoa física. Pior ainda, faz distinção, em soluções de consulta (e precedentes do CARF), entre pessoas jurídicas optantes do lucro real, para quem estaria vedado o regime peculiar, e lucro presumido (para quem o regime seria aplicável, desde que nos estritos termos da instrução normativa).

A despeito disso, é claro e evidente que   a Lei 9.393/96 prevê que as pessoas físicas ou jurídicas (estas optantes pelo lucro real ou presumido) estão autorizadas a apurar o ganho de capital sobre a venda de imóvel rural (entendido como o imóvel no qual seja exercida atividade tipicamente rural) pela diferença entre o VTN do ano de aquisição e do ano de alienação, independentemente de ter havido entrega tempestiva da DITR em um ano, em outro, ou em ambos.

Porém, nas situações específicas mencionadas, envolvendo pessoas físicas ou pessoas jurídicas (em especial, DITR não entregue ou fora do prazo), há risco de autuação pela Receita com base na IN 84/2001, a qual, contudo, é ilegal por trazer hipóteses não previstas na norma legal específica (Lei 9.393/96).

Essa ilegalidade tem chance de ser reconhecida em defesa.

Por Marlos Nogueira.

[1] “Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.”