Que vença a maioria: Lei nº 14.451/2022 altera os quóruns de deliberação nas Sociedades Limitadas

Que vença a maioria: Lei nº 14.451/2022 altera os quóruns de deliberação nas Sociedades Limitadas

Foi publicada uma novíssima Lei que, segundo sua justificativa, veio para “desburocratizar” e “simplificar” os processos internos das empresas: trata-se da Lei nº 14.451, de 21 de setembro de 2022 (com vigência após 30 dias), que modificou disposições do Código Civil relacionadas às Sociedades Limitadas.

Os empresários bem sabem que, até ontem, para cada deliberação importante da Sociedade, a Lei exigia quóruns de aprovação diferentes. A partir da nova Lei, que entra em vigor 30 dias após sua publicação, essa não será mais a realidade da maioria das empresas brasileiras.

Com as modificações, em grande parte dos casos, a aprovação das deliberações se dará por mais da metade do capital social, assim como acontecia na vigência do antigo Código Comercial (e como ocorre com as Micro Empresas-ME e  Empresa de Pequeno Porte-EPP). Com exceção da designação de administrador não sócio antes de integralizado o capital social, que agora exige um quórum de 2/3 (antes a Lei exigia a unanimidade), e da transformação do tipo societário (unanimidade, salvo quórum menor previsto em contrato), grande parte das demais deliberações serão aprovadas por maioria absoluta, ou seja, “50% mais uma quota”.  Lembrando que continua valendo o princípio geral da maioria: a deliberação é aprovada pela maioria de votos dos presentes nos demais casos previstos na lei ou no contrato, se este não exigir maioria mais elevada.

Isso significa dizer que, a partir do dia 21/10/2022, a designação, destituição e remuneração dos administradores serão aprovadas, via de regra, por mais da metade do capital social. Serão também aprovados pelo mesmo quórum as alterações no contrato social, a incorporação, a fusão, a dissolução e a cessação do estado de liquidação, a nomeação e destituição de liquidantes, e o pedido de recuperação (que antes já exigia somente a aprovação da maioria).

É claro que, com a modificação dos quóruns, a vida dos sócios majoritários ficará “mais fácil” – a aprovação dos assuntos que sejam de seu interesse será mais provável, e é possível dizer até que o majoritário ganhou mais “poder”. Os controladores absolutos em limitadas antes precisavam ter 75% das quotas; agora, basta mais da metade.

Na prática, milhares de negócios e arranjos societários feitos sob a ótica de um minoritário que “bloqueia” deliberações importantes por deter mais de 25% das quotas precisarão, agora, ser repensados, quando não rediscutidos.

Porém, se por um lado, o minoritário fica mais desprotegido, por outro as partes ganham liberdade para definir suas próprias regras societárias para além do que diz a lei.

Isso porque esse é o quórum “legal”. A Lei brasileira, ao prever quóruns específicos para a aprovação de determinadas matérias, visa somente evitar que os sócios estipulem quóruns abaixo dos limites nela previstos. E, claro, prever quóruns básicos que, à míngua de outra regra contratual, devem ser observados. Logo, é plenamente possível que, em contrato social ou em acordo de sócios, sejam inseridas disposições para exigir quóruns superiores à maioria. Em outras palavras, os negócios antes ajustados para um minoritário relevante (mais de 25% de quotas) ter voz confiando no quórum legal de antes poderão ter essa governança mantida, desde que os sócios, agora, prevejam quóruns diversos (e maiores) nos contratos sociais e/ou em acordos de sócios.

Portanto, se antes as Sociedades não viam necessidade de um acordo de sócios para reger as relações nela existentes, pode ser que agora seja o momento ideal para fazê-lo.

Além de ser um documento confidencial que pode tratar sobre os quóruns para deliberações, o acordo de sócios pode trazer múltiplos benefícios ao disciplinar a administração da Sociedade, regras para transferência e alienação de quotas, recesso e retirada, direito de preferência, distribuição de lucros, sucessão, e quaisquer outras matérias que sejam de interesse dos sócios.

Se a sua empresa foi surpreendida negativamente por essas modificações trazidas pela nova Lei, talvez seja a hora de repensar a forma pela qual são conduzidos os processos dentro da organização. Desburocratizar, sem dúvidas, é preciso – mas cabe a cada empresa ter liberdade para ditar quais serão as regras que valerão dentro da própria casa.

Por Marlos Nogueira e Jade Fioravante